quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Joaquim Cardozo

Poema do homem dormindo
 

O homem que dorme é um menino.
O homem que dorme é mais puro que 

                   [um menino, é um anjo.
O seu rosto parece uma noite de lua,
Ele tem nas mãos o espírito úmido de um lago.
Ele tem sob os olhos a sombra tranquila das coisas.
No leito em que durmo não quero mulheres,
Elas agitam o meu corpo e perturbam os meus sonhos.
Para que macular assim a pureza encantadora 

                                                  [do sono?
O homem que dorme está só,
Vive num mundo só dele, num mundo diferente
Onde qualquer lei científica pode ser alterada.
O homem que dorme conhece o milagre.
O homem que dorme imagina paraísos.
O homem que dorme é melhor do que os mortos.



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terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Vladimir Maiakóvski

DE "V INTERNACIONAL"

Eu
à poesia
só permito uma forma:
concisão,
precisão das fórmulas
matemáticas.
Às parlengas poéticas estou acostumado,
eu ainda falo versos e não fatos.
Porém
se eu falo
“A”
este “a”
é uma trombeta-alarma para a Humanidade.
Se eu falo
“B”
é uma nova bomba na batalha do homem.
(Tradução de Augusto de Campos)





segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Ricardo Reis

Mestre, são plácidas 
Todas as horas 

Que nós perdemos, 

Se no perdê-las, 

Qual numa jarra, 

Nós pomos flores. 


Não há tristezas
Nem alegrias 

Na nossa vida. 

Assim saibamos, 

Sábios incautos, 

Não a viver, 


Mas decorrê-la,
Tranqüilos, plácidos, 

Lendo as crianças 

Por nossas mestras, 

E os olhos cheios 

De Natureza ... 


À beira-rio,
À beira-estrada, 

Conforme calha, 

Sempre no mesmo 

Leve descanso 

De estar vivendo. 


O tempo passa,
Não nos diz nada. 

Envelhecemos. 

Saibamos, quase 

Maliciosos, 

Sentir-nos ir. 


Não vale a pena
Fazer um gesto. 

Não se resiste 

Ao deus atroz 

Que os próprios filhos 

Devora sempre.

Colhamos flores.
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos 

Calma também.

Girassóis sempre
Fitando o sol,
Da vida iremos
Tranqüilos,tendo
Nem o remorso
De ter vivido.


Ouvindo

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sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Elizabeth Bishop

Noturno

Da manga escura de um mágico
      os cantores de rádio
espalham canções de amor
pela grama, sobre o orvalho noturno.
       E preveem para o futuro,
qual cartomantes, o que se quiser supor.

Mas na antena do estaleiro distingo
       observadores mais dignos
de apreciar o amor. Do alto de seu galho
cinco luzes vermelhas, remotas,
       se aninham; fênix silenciosas,
ardendo aonde nunca chega o orvalho.

(Traduzido por Paulo Henriques Brito)


Original lido pela poeta

Em cena

Na sala de aula

Especial



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Orides Fontela

Ode

E enquanto mordemos
frutos vivos
declina a tarde.

E enquanto fixamos
claros signos
flui o silêncio.

E enquanto sofremos
a hora intensa

lentamente o tempo
perde-nos.



Declamada

Lembrada

Biobibliografia

Crítica



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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Armando Freitas Filho



Corpo
Acrobata enredado
em clausura de pele
sem nenhuma ruptura
para onde me leva
sua estrutura?

Doce máquina
com engrenagem de músculos
suspiro e rangido
o espaço devora
seu movimento
(braços e pernas
sem explosão)

Engenho de febre
sono e lembrança
que arma
e desarma minha morte
em armadura de treva.


Jorge Luís Borges


As coisas

A bengala, as moedas, o chaveiro,
A dócil fechadura, as tardias
Notas que não lerão os poucos dias
Que me restam, os naipes e o tabuleiro.
Um livro e em suas páginas a seca
Violeta, monumento de uma tarde
Sem dúvida inesquecível e já esquecida,
O rubro espelho ocidental em que arde
Uma ilusória aurora. Quantas coisas,
Limas, umbrais, atlas, taças, cravos,
Nos servem como tácitos escravos,
Cegas e estranhamente sigilosas!
Durarão para além de nosso esquecimento;
Nunca saberão que nós fomos num momento.

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